O teólogo e mestre em filosofia Jonas Madureira, em seu livro “Inteligência Humilhada”, diz que nós temos 3 tipos de referências (que preferi chamar de autoconhecimento para ficar mais didático).
A primeira, e a mais comum, é a alterreferência. Que é aquela definida pelo outro. Por exemplo, uma jovem que dedica sua vida acadêmica a fazer o curso que os pais querem, e depois disso, vai seguir suas paixões de fato.1
Todos nós passamos por uma experiência de definir a nossa personalidade por causa da opinião do outro. Mas o mais triste é quando alguém passa toda uma vida assim. Quando uma pessoa percebe que viveu uma vida de mentiras, como se usasse máscaras para agradar o outro, existem grandes chances desse indivíduo sentir uma espécie de culpa e vergonha, porque não teve coragem de se libertar dessa prisão.
Um outro exemplo comum, e ainda mais grave, é a alterreferência do Instagram. Esse fenômeno já é um fruto do nosso tempo. Mas imagine, se tomar as decisões baseadas na opinião de um familiar é prejudicial, imagina tomar decisões importantes baseadas nos atos que alguém que nem te conhece.
Aqui entramos num assunto mais complexo e interessante, que iremos tratar numa outra newsletter.
Mas antes de passar para a próxima, vale deixar um trecho do poema Tabacaria, de Fernando Pessoa, que define perfeitamente como é a vida de alguém que passou a vida inteira sendo outra pessoa:
“Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.”
A segunda demanda é o que chamamos de egorreferência. Que é quando uma pessoa cansa de ser guiada pelo desejo dos outros e dá um “Basta!” em sua vida. Essa fase é como se fosse um grito de liberdade onde a pessoa pensa que agora tudo será feito da forma que ela quiser, quando quiser. E se nós formos comparar com a anterior, realmente parece muito melhor.
É aqui que muitos influencers dizem que mora a construção da personalidade. E pode até ser. Mas viver para si não poderia ser pior. Porque na verdade nós não sabemos bem quem somos, o que queremos. E pode ser que nessa fase, o ser humano acabe voltando para a anterior, porque ele precisa se basear em alguma alguém pra saber o que vai trazer algum tipo de prestígio para um grupo específico.
Chegamos então à terceira, e verdadeira, demanda da vida do ser humano: a teorreferência. Nós só podemos nos conhecer verdadeiramente, quando conhecemos a Deus e buscamos sua palavra. Ele é o Criador de todas as coisas, e também o nosso criador.
Dadas as devidas proporções, o autoconhecimento e o conhecimento divino estão tão entrelaçados como Narciso e o rio, do poema O Discípulo, de Oscar Wilde:
Quando Narciso morreu o lago de seu prazer mudou de uma taça de águas doces para uma taça de lágrimas salgadas, e as oréades vieram chorando pela mata com a esperança de cantar e dar conforto ao lago.
E quando elas viram que o lago havia mudado de uma taça de águas doces para uma taça de lágrimas salgadas, elas soltaram as verdes tranças de seus cabelos e clamaram, "Nós entendemos você chorar assim por Narciso, tão belo ele era."
"E Narciso era belo?", disse o lago.
"Quem pode sabê-lo melhor que você?", responderam as oréades. "Por nós ele mal passava, mas você ele procurava, e deitava em suas margens e olhava para você, e no espelho de suas águas ele refletia sua própria beleza."
E o lago respondeu, "Mas eu amava Narciso porque, quando ele deitava em minhas margens e olhava para mim, no espelho de seus olhos eu via minha própria beleza refletida."
Narciso depende do rio, e o rio dependia de Narciso. Um não “existia” sem o outro, de modo que os dois estavam entrelaçados.
Que possamos buscar conhecer a nós mesmos e a Deus na mesma proporção, para que não usemos mais máscaras em nenhuma área de nossas vidas e vivamos uma vida que vale a pena ser vivida.
A maior de todas as ciências é conhecer-se a si mesmo. Porque quem conhece a si mesmo conhecerá também a Deus – Clemente de Alexandria.
Essa foi uma edição um pouco diferente, pra inaugurar essa nova fase da Depois do Trabalho. Fique à vontade para compartilhar o texto nas redes sociais.
Tamo junto!
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No livro ele conta a história de uma moça que completou toda a faculdade de direto, entregou o diploma dos pais. E depois foi estudar o que ela queria: literatura.